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Nós não vamos ganhar nada?

Brasil já viveu dias piores na história. Mas parecia haver mais soluções em campo.

Por Mauro Beting

Nunca antes na história deste país havíamos perdido tantas partidas como em 2001. Culminando com a eliminação nas quartas da Copa América para Honduras de El Primitivo Maradiaga. Não era o melhor Brasil possível escalado por Felipão com menos de um mês no cargo - e a menos de um ano de ser 100% no penta, no Mundial.

A seleção na Copa América na convulsionada Colômbia terminou em sexto. Atrás de Honduras e Costa Rica - e a grande Argentina, uma das melhores seleções do mundo em 2001, nem foi.

Falou Marcos, então assumindo a titularidade da meta: “o Brasil não é mais favorito a nada. Virou mero coadjuvante”. O palmeirense bateu na própria carne: “O Brasil tem uma história no futebol, mas eu não faço parte dela”.

No dia seguinte, editorial do jornal inglês “The Times” afirmou que o futebol-arte havia acabado. E se perguntava: “o [futebol do] Brasil também terminou?”. Felipão contestou e afirmou que seríamos um dos favoritos na Copa na Ásia...

Como fomos. Com Amoroso, Élber, Sonny Anderson, Alex, Djallminha, Emerson Puma, e Romário fora do grupo do penta.

Eram outros tempos. E a gente achava mesmo que já era em 2001. Que jamais seria em 2002.

A diferença, agora, é que ainda tem muita gente boa. Muito potencial para o panorama atual. Mas os rivais também tem. E a pressão pesa como a camisa.

Mas tudo isso todos sabem Sobretudo Diniz.

Não querendo passar pano, nem a patrola, meu texto editado em 2001 depois da derrota para Honduras, e de um Brasil que ainda corria riscos de não se classificar para a Copa de 2002.

"Copa da Paz. Copa da pá de cal na euforia afoita trazida no fio do bigode de Felipão. Não é de técnico o problema, é de técnica. A solução da seleção passa pelo túnel, mas é questão dos treinadores da base (que não formam boleiros) e dos “supertécnicos” (que deformam os times). Perder de Honduras é mérito deles, também. Mas demérito de quem só sabe de técnica, mal conhece tática. De quem sabe o que faz com a bola, mas não sabe como recuperá-la. De quem veste uma camisa tetracampeã, mas joga como se estivesse nu. De quem não sabe se joga de amarelo ou azul, se joga como Brasil ou Samoa. De quem não sabe mais nada.

A derrota, mais uma, teve de tudo. Não sobrou nada. A seleção começou armada para aprender a jogar com três zagueiros, mesmo que à frente só estivesse um hondurenho. Como Felipão ainda não tinha segurança no esquema e nos homens, meteu mais dois volantes no meio. E o Brasil ficou desgovernado, carente à frente, superprotegido atrás, perdido em todo o campo. Prato farto para o azedume dos que não querem ver três zagueiros nem pintados de amarelo. Ou azul. Sei lá.

Segundo tempo, Felipão tira como deveria um dos zagueiros. Em 11 minutos o Brasil cria mais, ousa mais, chega mais. Em alguns segundos a zaga toda bobeia, Honduras abre o placar. A seleção perde o prumo e prima pelo ridículo. Jardel vai ao jogo e a bola não vai a Jardel. O tetracampeão do mundo depende das bolas levantadas na cabeça de um poste, que só recebe o vento dos cruzamentos pela linha de fundo. Prato cheio para os que defendem que não há como o Brasil se defender bem sem um terceiro zagueiro.

o Brasil empatou muito mal com três zagueiros, e perdeu muito feio com apenas dois. A questão não é de números. É de letras.

A culpa é da bola, que entra na meta brasileira mais vezes do que antes, e que entra menos na “goleira” alheia - como se diz no Sul. A culpa é do grama (a unidade de medida), que faz a camisa amarela pesar mais do que antes (e até a azul). A culpa é da arbitragem, que não marca mais pênaltis discutíveis para a gente, e só anula um gol legítimo deles. A culpa é da Conmebol, que desmarca e marca um torneio sem a menor vergonha e faz a gente passar outras tantas. É também culpada pela suspensão furreca do Murtosa, que não podia ficar no banco, e ficou do mesmo jeito.

O culpado foi o telefone sem fio (não o celular), que fez cada instrução de Felipão passar pelo auxiliar, pelo preparador de goleiros, pelo coordenador, pelo massagista, até não ser entendida pelo jogador da seleção. A culpa também é da altitude de Manizales, da baixitude de Cali, do nível do mar de Montevidéu, do fuso do Japão... É do calendário. É do tempo para treino. É da safra de jogadores. É da cifra dos jogadores. É da cepa dos treinadores. É da selva dos cartolas. É dos selvagens das arquibancadas. É dos senhores dos patrocínios. É dos jornalistas que vendem, dos que se vendem, dos que são vendidos. Dos que não vendem, não se vendem, e não estão no mercado.

É culpa de tudo. De todos. E da gente que se acha mais que todos, que tudo.O Brasil não invade mais ninguém como se fosse Granada. Todo jogo é Vietnam. Não é fácil para quem faz as coisas difíceis. É tempo de botar o melhor time possível em campo. E, no gramado, fazer com que ele encare todo jogo como se fosse o final não de uma Copa, mas do próprio mundo. É hora de o Brasil jogar como Honduras. Para não perder como se fosse igual.

Já perdemos com os titulares, com os reservas, com bons técnicos, com treinadores nem tanto. Já tivemos quatro técnicos, mais de 100 jogadores chamados. E só um cartola [Ricardo Teixeira, desde 1989].

Se a camisa da seleção pesa. Se a cor - amarela, azul, de burro-quando-foge, de bagre-quando-joga - não importa mais. Se ninguém mais respeita a amarelinha, a azulzinha, o amarelão. Se não existe mais amor à camisa - de qualquer cor, de qualquer time. Se a camisa é um outdoor... Então, que se jogue sem. Seleção descamisada. Sem cor, sem lenço, sem documento.

Que o Brasil jogue nu. Sem camisa. Pelado. Como se joga pelada. Um time com camisa, de qualquer cor, e outro sem camisa. Nem colete, que isso é coisa de escolinha de futebol. Que se jogue pelado como nas peladas de rua, de campinho, de terra, de grama, de areia, de qualquer coisa. Futebol que todos esses que estão de mal com a bola um dia já jogaram. Um jogo descompromissado, desinteressado. Passatempo. De criança.

Futebol brasileiro, enfim. Sem camisa. Sem chuteira. Descamisado e descalço. Sem amarras. Para ver se a gente vai pra 2002, na marra, sem medo. Pode parecer poesia de telenovela, mas é do resgate da alma que a gente resolve problemas que a nossa cabeça não sabe equacionar.

O time é esse aí. Não adianta praguejar, lembrar craques de antanho, ou mesmo bons jogadores que ainda estão por aí. É fácil repisar todos os nossos erros, citar todos os acertos dos outros. Nem é preciso lembrar das bolas e boladas levantadas pelas CPIs, e das contas que devem ser pagas pelos que ainda não foram pegos. Nada disso vai resolver o que a seleção precisa começar a reverter em 15 de agosto. Vencer o Paraguai. Ganhar três pontos para chegar a oito da classificação para 2002. E, daí, continuar a revolução de modos e nomes. Só não pode ser um paredão amplo, geral e irrestrito. Essa “chacina” poderia fazer perder quem ainda tem muito a ganhar.

"Eu não acredito no futebol de hoje. Mas quero acreditar no time da minha terra”. Falou e disse ao “Lance!” Delphim da Rocha Netto. Goleiro, jornalista e historiador do XV de Piracicaba e da bola do Brasil. Ele pode dizer que ainda não havia visto dias tão longos como os do Nho Quim, e noites tão curtas para quem já foi tetracampeão mundial.

“No futebol não somos mais aqueles ‘artistas’ de antes, nem temos a organização e a ‘força’ da Europa. Estamos num estranho limbo, tão estranho que nossos melhores jogadores são chamados de estrangeiros (imagine se Pelé e Garrincha fossem chamados de “estrangeiros”...)”. Escreveu Marcos Augusto Gonçalves no mesmo jornal.

Martinho da Vila disse outro dia que “globalizaram o futebol e acabaram com o do Brasil. Que era criativo, que se destacava”. A citação é de Matthew Shirts, no Estadão, em texto sobre a seleção brasileira. Shirts literalmente veste a camisa do país. Ele é brasilianista, uma profissão que tenta entender e explicar o Brasil. Ofício tão simples como apontar o caminho da rede para a nossa bola. Trabalho tão complexo pelas teias da vida. Ou como deixou claro Vicente de Aquino, aqui ao lado: “quando o jornalismo cede lugar para o show, quando os interesses comerciais ficam acima dos coletivos, é sinal de que as coisas não vão bem”.

Junte tudo o que foi dito, adicione aquilo que você pensa, e você vai ter a fotografia do Brasil. Um futebol que não sabe se vai ou se fica, se joga brasileiro ou estrangeiro, se escala estrangeiro ou brasileiro, se escreve Brasil ou Brazil. Um futebol desterrado e enterrado. Sem bússola, sem mapa, sem documento, só lenço.

"Os jogadores brasileiros ainda têm o futebol nos pés, mas não sabem passar isso para a cabeça”. Falou o mestre Telê a “O Globo".

Esse era o retrato do Brasil em 2001.

A um ano do penta.

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